Existe algo profundamente errado quando você paga por um jogo e, anos depois, ele simplesmente deixa de existir. Não porque quebrou, não porque você perdeu, mas porque uma empresa decidiu que não vale mais a pena manter os servidores ligados. A campanha Stop Killing Games, liderada por Ross Scott, acaba de atingir 1 milhão de assinaturas – um marco que representa muito mais que números. Representa a revolta de uma geração inteira de jogadores que se recusa a aceitar que “comprar” um jogo não significa possuí-lo.
O Cemitério Digital Cresce
A lista de jogos mortos é um epitáfio da era digital: The Crew, Battleborn, Anthem. Títulos pelos quais milhões de pessoas pagaram e que hoje são apenas memórias. Essa semana a EA anunciou que Anthem terá seus serviços encerrados. Mais um para a pilha.
Mas o problema vai além dos live services óbvios. Cada vez mais, jogos single-player exigem conexão constante com a internet – seja por DRM, progressão server-side ou conteúdo episódico trancado atrás de servidores de download. Quando o suporte acaba, jogadores perdem acesso a experiências que pensavam ter comprado.
A Hipocrisia da “Propriedade”
A Ubisoft disse aos jogadores que eles “não podem reclamar” do fechamento de The Crew porque, apesar de terem pago pelo jogo, nunca realmente o possuíram. Deixe isso afundar: você paga $60 por algo, mas não é dono. É apenas um “licenciamento temporário” que pode ser revogado a qualquer momento, sem aviso, sem compensação.
Ross Scott e o movimento Stop Killing Games estão lutando contra exatamente essa prática. A crença central é simples: se um jogo é vendido, deve permanecer jogável de alguma forma, mesmo após o suporte oficial terminar.
As Soluções Não São Impossíveis
O movimento não está pedindo que empresas mantenham servidores para sempre. As soluções propostas são razoáveis:
- Modos offline para jogos que não precisam ser online
- Software de servidor público para que comunidades possam hospedar seus próprios servidores
- Proteções legais que garantam esses direitos aos consumidores
Scott observa que 68% dos 700 jogos dependentes de online já são injogáveis ou se tornarão em breve. É um genocídio cultural em câmera lenta.
O Efeito Streisand de PirateSoftware
Ironicamente, a campanha recebeu um impulso inesperado de Jason Hall (PirateSoftware), ex-funcionário da Blizzard que tentou desacreditar o movimento. Seus vídeos criticando Stop Killing Games como “muito vago” e “impraticável” geraram uma reação massiva da comunidade.
Criadores de conteúdo como MoistCr1TiKaL, PewDiePie e Jacksepticeye responderam defendendo a campanha, amplificando sua mensagem para milhões de seguidores. O que deveria ter matado o movimento acabou ressuscitando-o.
A Força da União Europeia
Com 1 milhão de assinaturas verificadas na UE, a Comissão Europeia agora é obrigada a considerar formalmente nova legislação. Esta é a mesma comissão que forçou a Apple a adotar USB-C nos iPhones. Quando a UE decide agir, gigantes da tecnologia tremem.
Ross Scott ainda pede mais assinaturas, visando 1,5 milhão para garantir que, mesmo após validação, a petição se qualifique para revisão. Porque algumas assinaturas podem ser inválidas ou não verificáveis.
Mais Que Preservação: É Sobre Dignidade
No fundo, Stop Killing Games não é apenas sobre preservação de jogos. É sobre dignidade do consumidor. É sobre o direito básico de possuir algo que você comprou. É sobre não ser tratado como um ATM ambulante que pode ser desligado quando não for mais conveniente.
Quando você compra um livro, ele não desaparece quando a editora fecha. Quando compra um filme em DVD, ele não para de funcionar quando o estúdio decide. Por que jogos deveriam ser diferentes?
A resposta está em nossas mãos. Cada assinatura é um voto pela preservação cultural, pela dignidade do consumidor, pelo direito de possuir o que compramos. Um milhão de pessoas já disseram “basta”.
A pergunta é: você será a próxima?